segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Jogos sem Fronteiras ou a vontade de ver os mais pequenos ganharem qualquer coisinha




A música começava, os bonecos desengonçados corriam para cima das letras gigantes e o meu coraçãozito acelerava. Os Jogos sem Fronteiras eram um acontecimento nas noites de verão da minha infância. E despertaram em mim os primeiros sinais de justiça social: invariavelmente, torcia pelos mais fracos.

A coisa funcionava mais ou menos assim:

No início do programa, eu era a espectadora imparcial, que se limitava a apreciar as várias provas e vibrava com “Attention, prêts, Piiiiiiiii” do Denis. Ao segundo ou terceiro jogo, quando uma equipa começava a destacar-se pela negativa e a acomodar-se no fundo da tabela, eu tornava-me numa entusiasta apoiante desse país. A partir daí, acompanhava cada etapa com emoção, na expetativa de que os meus pequenos desajeitados ganhassem qualquer coisinha. E rejubilava cada vez que um desses países conseguia uma reviravolta na tabela e passava para a liderança. Eram estas as minhas pequenas conquistas no final dos anos 80.

Depois, os Jogos sem Fronteiras eram também um convite ao sonho. Naquela altura, com cinco ou seis anos, eu ainda não sabia que não tinha coordenação motora; ainda não sabia que, anos mais tarde, quando me passassem a bola nas aulas de educação física, tenderia a desviar-me inconscientemente, com medo de ser fatalmente alvejada. Com cinco anos, eu divertia-me a dar cambalhotas no sofá da minha avó e mal podia imaginar que iria desenvolver uma espécie de fobia à ginástica quando chegasse ao ciclo; vivia na aldeia e corria pelo pátio, sem saber que, mais tarde, acharia que correr é uma canseira. Enfim, aos cinco anos eu achava – ou melhor sonhava – que viria a participar numa edição dos Jogos Sem Fronteiras quando crescesse. Às vezes, ao deitar, no fim de mais uma emissão, fechava os olhos e revia as provas todas, imaginando-me aos comandos da equipa vencedora.
Feliz ou infelizmente, os Jogos Sem Fronteiras terminaram antes que eu tivesse idade para participar no concurso e não tive de passar pela humilhação de admitir as minhas flagrantes inabilidades físicas.

Se eu gostava que os Jogos sem Fronteiras voltassem? Sim, e não. Sim, claro, porque tudo o que seja reviver a tv da infância é sempre mágico. Não, porque tenho medo que afinal aquilo não seja assim tão genial. Às vezes, quando o zapping me leva aos “Soltem a parede” e outros produtos sucedâneos desta vida, dou comigo a pensar se os Jogos sem Fronteiras eram aquilo. Se eram assim uma parvoíce de pessoas a escorregar e a cair em piscinas. Sei que não eram, e podia elencar uma vasta lista de diferenças entre os Jogos e esses joguitos da tv moderna. Mas eu também achava que podia ser a estrela que ajudaria a equipa da Figueira da Foz a conquistar a final europeia. Por isso, na dúvida, prefiro deixar este assunto na caixinha das recordações.



(Bem sei que ABF já tinha refletido sobre os Jogos Sem Fronteiras, mas eu não podia regressar à infância e deixar esta memória de lado. Aviso já que serei igualmente implacável quanto à Rua Sésamo, ao Babar e às pastilhas Gorila. Lá iremos, um dia)

sábado, 23 de novembro de 2013

Os Jogos das noites de verão



Na minha infância, verão não era apenas sinónimo de dias sem aulas, brincadeiras na rua e praia. Era também sinónimo de Jogos Sem Fronteiras (JSF). Um programa de televisão verdadeiramente incontornável para a minha geração (nascida a meio da década de 80) e que hoje muitos pedem que regresse. É claro que falar de JSF é também falar de Eládio Clímaco (ainda hoje não sei bem quem fez o sucesso de quem).

Lá em casa era assim: mal o genérico arrancava com a música da Eurovisão e os bonequinhos coloridos começavam a dançar rumo à coroa de guizos, corríamos os quatro para o sofá e cada um escolhia o seu País. E ninguém podia escolher Portugal. Invariavelmente escolhia San Marino, e mais tarde Malta - não sei se pelo nome, que para uma criança de nove anos era exótico, se pela minha tendência de apoiar os pequeninos. Escusado será dizer que nessas cinco edições nunca me sagrei campeã. Mais sorte tinha o meu pai que escolhia sempre as nações mais fortes (França, Itália, Espanha) e volta e meia era o vencedor dos nossos JSF caseiros.

Além da animação das provas dentro de água ou em fatos estranhos, os JSF remontam a uma era em que a magia da televisão unia famílias inteiras em frente ao ecrã. Mas não numa lógica de alienação em que cada um fica calado a ver passar as imagens. Eram noites em que se apoiava uma equipa e se lutava por ela contra os outros elementos da família. Uns jogos que decorriam em paralelo com as escaladas a paredes que escorriam água ou corridas vestidos de cavalo ou leão.

E agora o que dizer dos apresentadores: Eládio Clímaco e Ana do Carmo (para citar apenas uma das duplas) que se vestiam a rigor para cada edição. Ora combinando a cor da camisa e do vestido, ora incorporando todo o espírito da emissão, como quando em 1992 se vestiram a rigor para uma emissão na Torre de Belém dedicada aos descobrimentos.

O regresso dos Jogos já esteve prometido (em 2007 e 2008), mas até isto a crise estragou. Não há dinheiro, não há convívio, nem saudável competição entre os países europeus que agora competem por outras coisas que não um simbólico troféu oferecido pela cidade que acolhia cada edição.
É a Europa que temos.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

E “Pimba” o Bruno arrasou o Quimbé


O Pimba está na moda. Na verdade, sempre esteve. Basta recuar 15 anos para nos lembrarmos dos expositores giratórios com cassetes nos restaurantes, seguros por pequenos cadeados e onde reinava a música popular. E os bigodes fartos.

Desde então o Pimba nunca desapareceu das vidas dos  portugueses. Há um denominador comum nos artistas mais contratados para festas fora dos grandes centros urbanos, nos tops nacionais de música, nas atuações em programas de televisão e, vá, nas rádios locais: a "música pimba" – nome dado pelo Emanuel, que agora é mais Kizomba.

As elites nunca foram conquistadas, mas isso acabou. Na despedida de Lisboa do espectáculo “Deixem o Pimba em Paz” (no dia 19 de novembro) brotaram os intelectuais, os pseudos e equiparados. Falemos então do espectáculo musical de Bruno Nogueira e Manuela Azevedo no Tivoli BBVA (naming mais-que-Pimba). O conceito pensado pelo Bruno é basicamente dar novas roupagens (jazz e pop) a músicas pimba já existentes, o que – tendo em conta o toque de midas de Bruno e a voz de Manela – tinha tudo para dar certo.

O espetáculo arrancou mal, apesar do pequeno número de stand-up de Bruno Nogueira. Evitando aqui spoilers, diria que as primeiras músicas do show assemelhavam-se a ver um espanhol a cantar fado no filme do Saura, misturado com qualquer coisa desconexa parecida com Kusturica e a No Smoking Orchestra. Às primeiras três músicas o que me ocorreu foi: "Epá, já vi o Quimbé e o Rubim fazerem melhor que isto". Passo a explicar: o Pimba também está na moda na malta da “noite” (É vdd ixto, meus putos. Lolaaada. XD).

Duas semanas antes tinha tido a oportunidade de vislumbrar uma festa “Pimba Chic” numa discoteca main stream. O Quimbé (eterno apresentador da Sombra da Bananeira, que também se chama Nuno Eiró – sim, eu acredito que eles são a mesma pessoa) e o Rubim (namorado da Mónica Sofia, a primeira mulher a despir-se para a Playboy portuguesa) auto-intitulavam-se os P*ta da Loucura e faziam um espectáculo de DJ e VJ (isto existe?), além de pequenos aprontos teatrais com cabeleiras, simulações de episódios da Guerra das Estrelas e davam...novas roupagens às músicas pimba (e às músicas comerciais). Está bem que a cerveja ajuda, mas aquilo até nem foi nada mau. Ou, pelo menos, bem melhor que as três primeiras músicas do espectáculo do Bruno e da Manuela.

Já estava eu a pensar no porquê  de não estar a ver o Ronaldo a marcar três aos suecos e a lixar as vendas à Pepsi, quando o Bruno e a Manuela dão genialmente a volta ao texto (ou à pauta). As interpretações das músicas foram ganhando sentido (musical e estético) e tornou-se num espectáculo bastante agradável. Valeu o bilhete. Interpretações de músicas de Graciano Saga, Marco Paulo, Quim Barreiros ou Leonel Nunes (que o Bruno confidenciou não conhecer antes desta experiência, o que é lamentável) mostraram todo o nível do Bruno, enquanto "cantactor", e de Manuela Azevedo, enquanto cantora.

Dizia-me uma amiga à saída do espectáculo que nunca esperou ver Manuela Azevedo a cantar “Bonito, bonito, é ver os tomates a bater no pito”. Eu respondi: “Bem, o H2Homem também não tem uma letra brilhante”. A voz de Manuela é brutal, o que se evidenciou quando cantou num estilo jazz, a solo, o “Não És Homem Para Mim” da Romana – número já feito vezes sem conta pela Luísa Sobral.

Houve ainda bombons no espectáculo como um pequeno número do Markl, bem geek como só ele sabe, e uma música cantada pelo Marante. Por tudo isto, o Bruno e a Manuela conseguiram bater o Quimbé e o Rubim.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Xabi: o único que sabe quem é o Lichtenstein


Xabi Alonso já jogou quatro vezes contra o Liechtenstein, mas nunca marcou, apesar da sua seleção ("La Roja") ter totalizado 16 golos nessas partidas. Até o seu homónimo (se excluirmos o sotaque de Viseu) Xavi molhou a sopa, mas o jogador do Real Madrid nunca marcou à equipa do principado. Não se sabe se Xabi terá um gosto especial pelo Liechtenstein (o principado) mas se fosse um artista plástico não haveria dúvidas de que seria o Roy, nome grande da PopArt.

Vamos à argumentação. Xabi é um jogador diferente, talvez o único hipster do futebol (sim amigos, podem pôr  fotos no Instragram e usar óculos de massa, mas enquanto dançarem Telô no balneário, esqueçam). A GQ brasileira mostrou recentemente que as séries de TV favoritas de Xabi são Homeland, Mad Men, The Wire e Dexter (Hispster alert: elevado). Já os gostos musicais, rebentam a “hipster scale”: o médio espanhol é fã de The Black Keys, Smiths, Tom Petty e Josh Rous.

Está bem que a “Cara de Barcelona”, escultura de Lichtenstein, não abona na colagem ao madridista Xabi, mas, para compensar, Xabi é – de longe – o jogador do Real Madrid com o estilo mais catalão.Além disso, Xabi Alonso é uma espécie de herói de banda desenhada, que Lichtenstein tanto destacou nas suas obras. Em 2005, quando ganhou com as cores do Liverpool a final da Champions contra o AC Milan,  em Istambul, teve até direito a ser protagonista de uma história aos quadradinhos, intitulada de “As mágicas aventuras de Stevie  [Gerard] e Xabi em Istambul”.

Dirão que os hipsters também gostam de Warhol. É verdade. Mas Warhol era louco (não se está a ver Xabi Alonso a ser ousado dentro das quatro linhas, como quando Andy, por exemplo, dirigiu um filme intitulado de Blow Job). O filme é mudo (o que face ao título não deixa de ser interessante). Mas Mourinho diz que Xabi é um excelente comunicador, logo também não encaixa.

Xabi Alonso é um pai de família, dedicado, tal como Lichtenstein, cujo o primeiro quadro que pintou foi do Rato Mickey que fez para... oferecer aos filhos. Por tudo isto e – por ser dos poucos jogadores de futebol que apreciaria um “Quadro Linhas”– Xabi foi o escolhido para estrear esta rubrica.