sexta-feira, 14 de março de 2014

L'OREAL, porque eu e o Paulo Fonseca merecemos
















“Luís Castro tem um penteado normal. E isso conta... muito”
Miguel Sousa Tavares, in A Bola, 11 de março de 2014

Eu já tinha ouvido de relance na televisão – entre a jocosidade da “confiança cega” – um comentador a atribuir o fracasso do Paulo Fonseca no Futebol Clube do Porto ao penteado com gel. Ou melhor: ao “cabelo espetado”. Tomei como uma brincadeira, mas na terça-feira Miguel Sousa Tavares volta ao assunto n'A Bola falando no “penteado normal” do novo treinador do Porto (Luís Castro), referindo ainda como é bom o novo técnico vestir-se com “sobriedade e elegância”.

Ora, independentemente do que eu acho do trabalho do Paulo Fonseca, é um ultraje associar o trabalho ao penteado. Até porque me parece mais apresentável que o dos técnicos dos rivais direitos: Leonardo Jardim nem tem cabelo e Jorge Jesus é aquele misto de Mick Jagger (se pintasse o cabelo de branco-loiro) e Simone de Oliveira (se  pintasse o cabelo de branco-loiro).















Eu sei que esta parece uma questão menor, mas não é. E escrevo este post pela defesa dos cabelos espetados deste mundo (Ellen Degeneres, não precisa de agradecer). Eu uso cabelo espetado e utilizo gel, que (passo a publicidade) é da L'oreal. Porque eu mereço.

Confesso que na minha vida profissional, não raras vezes dou com os entrevistados a olharem para o meu cabelo e sinto que é feito um certo juízo só por ter o cabelo em pé. Acontece mais com políticos e com a "velha-guarda". Julgo que, às vezes, uns se esticam só por eu ter o “cabelo espetado” e sentem-se no direito de fazerem comentários. De vez em quando lá sai a pergunta: “É estagiário?” Ou então: “É novo não é? Que idade é que tem?” Ou pior: “Têm aí um cabelo todo...”.

Houve até um  ministro de um Governo de coligação (não digo qual) que uma vez se sentiu no direito de fazer comentários impróprios sobre o meu cabelo durante uma entrevista. Ainda que na brincadeira, o facto do cabelo ter gel deu-lhe esse poder (esta é uma história deliciosa de mais para ser queimada neste texto e, por isso, vou deixá-la para outra altura).

Uma vez um chefe disse-me que eu era melhor jornalista que um camarada meu, mas que o outro camarada tinha um ar mais político. Supus que era por causa do cabelo, uma vez que nesse dia até estava enpinguimzado (vem do verbo inventado empinguar, que significa “tornar pinguim”). Outra vez, um amigo meu que usava cabelo espetado foi trabalhar para um gabinete ministerial e a primeira vez que fui almoçar com ele depois disso  trazia o cabelo sequinho, penteado para o lado, igual ao dos outros pinguins. Quando dei aulas, cheguei a ouvir de um aluno: “Nunca tive um professor com cabelo espetado”. Este meu drama (e do Paulo Fonseca) está assim entre o bullying do básico e uma praxe da COPA da Lusófona.

Deixo aqui um aviso os senhores que adoram os “cabelos à CDS” (ainda que tenham muito aquilo de que o Ronaldo fala no anúncio da Linic, a ole[o]sidade): Nós, os do cabelo espetado, não vos vamos render aos vossos cânones. A competência não depende, nem nunca dependerá, do cabelo. Se assim fosse, coitado do Rui Massena. Se assim fosse, o  Einestein não teria sido o Einstein. E o Cristiano Ronaldo não era o Cristiano Ronaldo.

Não sei em que medida o cabelo do Paulo Fonseca contribuiu para a sua saída do FC Porto. Acho que a culpa foi mais do gel do Moutinho e do James terem saído dos cacifos do balneário. Porém, se houve alguma parte de responsabilidade do cabelo nisso, demonstro desde já o total repúdio e solidariedade para com o Paulo Fonseca. Acho até que se podiam criar os direitos da minoria do cabelo espetado, não conheço nenhum chefe de Estado no mundo com o cabelo espetado. Mas há esperança.  Este ano, nós, os(as) do cabelo com gel, já tivemos uma representante a apresentar os óscares. Em breve, dominaremos o mundo. Porque, independentemente do cabelo, nós merecemos.

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